quinta-feira, 18 de maio de 2017

PHILOMENA




Data de lançamento: 14 de fevereiro de 2014 (1h 38min)
Direção: Stephen Frears
Gênero: Drama
Nacionalidades: Reino unido, França, EUA

Sinopse:  O filme é baseado em fatos reais. Nos anos 1950, uma jovem irlandesa engravida e acaba sendo enviada para um convento. Lá, as freiras a convencem a abrir mão de seus direitos sobre a criança, em troca da expiação do seu pecado. Philomena trabalha duro na lavanderia do convento e mal pode ver o filho, que é adotado por uma família dos Estados Unidos. Muitos anos passam e  Philomena (Judi Dench) resolve reencontrá-lo. Um jornalista famoso (Steve Coogan), também às voltas com questões pessoais, decide investigar a história com a intenção de vendê-la  como matéria para uma editora. A investigação revela-se mais complexa do que o esperado, envolvendo descobertas dolorosas, envolvendo conflitos pessoais e dogmas religiosos.
Philomena é um daqueles filmes que esbarram em você pelo caminho sem qualquer pretensão. O título e a pequena sinopse nada contribuíram para despertar maior interesse, no entanto, é assim que nos surpreendemos. O quase nada anunciado revela-se uma emocionante viagem.
Impossível não fazer um paralelo entre Philomena e Em Nome de Deus, filme que já resenhei. Ambos abordam o tema das instituições religiosas, os chamados Asilos de Magdalena. Um assunto pesado, que causa indignação e estranheza. A austeridade da vida imposta à protagonista, mesclada à uma boa dose de crueldade vinda de quem deveria oferecer auxílio e compaixão, traz uma carga de dramaticidade e densidade difícil de ser digerida. Mesmo assim, o enredo prende a atenção, pois quem não quer saber o que aconteceu com o filho de Philomena?
O filme conta com a bela trilha sonora do premiado Alexandre Desplat, indicada ao Oscar 2014, ao lado de mais três indicações: Melhor Filme, Melhor Atriz e Melhor Roteiro Adaptado. No Festival de Veneza 2013 foram nove prêmios.
Não assista a esse filme se estiver deprimido, mas apenas se for capaz de disponibilizar espaço para uma enxurrada de sentimentos conflitantes. Vale o risco!

Cotação: ****

sábado, 11 de fevereiro de 2017

SAPATOS E SEUS PASSOS




Osório e Onofre – Os iguais e os diferentes

Literatura infantil

Autora: Marcia Claro

Editora: Jaguatirica
Número de Páginas:42
Número Edição:1
Ano Edição:2016



Um livro que já chama a atenção pelo formato e nos encanta com as ilustrações lúdicas de Fran Junqueira. O conteúdo trata da importância de se respeitar as diferenças entre as pessoas, mesmo quando estas parecem ser tão semelhantes. 


Osório e Onofre são personagens sapatos, idênticos como gêmeos. Na aparência são iguais, porém se revelam únicos com as particularidades e os detalhes inerentes a cada um. A autora traça um paralelo com as semelhanças e as diferenças encontradas nas pessoas. 

A mensagem transmitida por este livro de sensível temática é a de que é preciso lidar com as diferenças, salientando a beleza da individualidade de cada um. Os gostos e características tornam cada ser especial e raro. A diversidade humana torna-se valorizada e representada por sapatos, cada um com as suas qualidades. 


Márcia Claro aborda em seu primeiro livro publicado, a importância de se enaltecer as diferenças entre os pares, pois cada um de nós apresenta um universo particular que torna a convivência diária muito mais rica. 


As páginas de Osório e Onofre surgem bem coloridas, com ilustrações criativas e encantadoras. As palavras colocadas de maneira habilidosa pela autora prendem a atenção das crianças e dos adultos.  O leitor surpreende-se com a fluidez desta deliciosa narrativa. 


Um livro que traz encantamento e diversão. Uma viagem ao mundo dos sapatos, com sua diversidade e bom humor. 

Vale cada minuto de leitura e muito mais! 

Cotação: *****






sexta-feira, 4 de novembro de 2016

PRETÉRITO IMPERFEITO ou PERFEITO?




Aviso aos navegantes: Esta não é uma resenha imparcial. Não poderia ser, já que minha avaliação baseia-se em impressões bastante subjetivas, contaminadas pela admiração que nutro pelo autor. No entanto, onde houver discernimento e algum critério, lá estará meu senso crítico. 


Pretérito Imperfeito, romance do escritor Gustavo Araujo, teve como inspiração o conto A Menina na Floresta, escrito pelo autor, em 2009. A edição, realizada pela Caligo Editora Ltda., impressiona pela qualidade e beleza. 


A história desenvolve-se na cidade fictícia de Porto Esperança, focando-se em três personagens: Toninho, Cecília e Pedro Vieira. Pode-se dizer que o livro trata do amor, em suas formas mais sutis e mais agudas. Sentimentos provocados, daqueles que incomodam e surgem sob as densas camadas da imaginação de cada um. 


Apesar de ter iniciado a leitura com expectativas bastante elevadas, Pretérito Imperfeito conseguiu me surpreender. Não, não fui às lágrimas. Não salguei as páginas do livro, mas confesso que alisei as palavras com carinho e permaneci muito cautelosa durante a leitura. A narrativa flui fácil demais e isso me assustou. Não estava preparada para abandonar os personagens, ou pior ainda, ser desamparada por eles quando tudo chegasse ao fim.  Fiquei refém de um romance (poético isso, não?).  


Com muita destreza com as palavras e hábil formação de belas imagens, que atravessam toda a narrativa, Gustavo Araujo, consegue o improvável: fazer o leitor torcer pelo “vilão” da história. Fácil é se apaixonar pelo menino Toninho e desejar cuidar de Cecília, mas com Pedro Vieira, a conversa é bem outra. Apesar de todas as razões para se odiar o personagem, em determinados momentos, torna-se impossível não se comover com os fundamentos da construção da sua difícil personalidade.


(...) que mesmo alguém como ele estava ao alcance da redenção. (p. 275 )

O título do romance já revela poesia, mesmo que alguns possam associá-lo às aulas de gramática e aos temidos tempos verbais. Pretérito Imperfeito foi a escolha acertada, pois representa muito bem o enredo do romance – dois meninos com vidas diferentes, ligados por um passado bem imperfeito. 


O nome da cidade que serve de cenário para a trama – Porto Esperança – também desperta interesse. Passa a ideia de um lugar de raízes - pouso – atracação – o porto, e ao mesmo tempo, remete à esperança de um futuro. Ou seja, o passado (porto) e o futuro (esperança) estão amalgamados em um só local. 


Intercalar a narrativa com o cotidiano de Pedro, as cartas de Cecília e o passado de Pedro Viera foi uma grande sacada. As cartas de Cecília à amiga Carol (que surge como uma destinatária misteriosa/imaginária) são lidas como se formassem um diário – o que parece ter sido mesmo a intenção do autor. 


Inevitável relacionar as cartas ao livro O Diário de Anne Frank, o que ao ler o posfácio, percebe-se que houve mesmo essa inspiração. São passagens que revelam muita sensibilidade e destreza com as palavras. Se você achar que a escrita de Cecília revela uma maturidade inverossímil para uma menina de 13 anos, saiba que eu mesma era assim nesta idade. Aliás, adolescentes são surpreendentes, de uma forma ou de outra. 


No decorrer da leitura, há um momento de estranhamento. O leitor depara-se com um cruzamento de realidades e memórias. O paralelismo do tempo e das vidas de Toninho e Cecília provoca desconfiança a princípio. Uma cutucada no leitor – Ei, tem algo esquisito acontecendo aqui. Em que ano foi isso? – O que serve para atrair ainda mais a atenção para a trama. Qualquer explicação torna-se desnecessária, pois roubaria a magia do encontro dos dois meninos. 


Há muitas interligações em todo o texto: os pássaros, os lugares, as várias tonalidades do céu e elementos simbólicos como a escada, impressionante construção de imagem, relacionando o terreno ao celeste. 


Atenção: a seguir, spoiler detectado. 


Olhou ao redor. Havia ali uma escada. Dessas de madeira com os degraus firmes e bem ajustados. (p.253)


Gostei do link entre os sonhos. O delírio de Toninho no poço com o sonho que ele havia tido com uma escada, uma ave e a mãe: 


Via um passarinho, um sabiá talvez, pousando sobre um livro suspenso no ar a dezenas de metros do chão. Toninho percebia então que ele próprio agarrava-se a uma escada e subia na direção da ave. (p. 29/30)


No sonho, Toninho não alcançava a ave porque ouvia a mãe chamando. No seu delírio/sonho no fundo do poço, o menino escuta Mariana/Cecília pedindo para ele ficar, ali, junto com ela. A mãe e a menina, figuras femininas, ambas amadas por Toninho, mas que estavam presas no passado (no fundo do poço das lembranças). 


Os pássaros, paixão do menino Toninho, surgem com todo o seu simbolismo, formando um quadro bem interessante. Representando a leveza, o divino, a alma, a liberdade e até a amizade. Suas asas traduzem a liberdade da imaginação, são os mensageiros entre o céu e a terra.


E o que dizer de certas frases que despertam suspiros? 


Ah, aquele olhar de feiticeira. Como dizer não?  (p. 84)

O que fazer quando se sabe o momento exato em que tudo irá acabar? (p.140)


Pretérito Imperfeito é um daqueles romances que prendem a atenção de forma imediata, agregando um misto de delicadeza, embasamento político/histórico às nossas referências pessoais. O livro atinge em cheio o sótão das memórias, revirando caixas de sentimentos e questões bastante particulares. Quando nos damos conta, já estamos encantados.  


Este é, sem dúvida, um livro que merece ser conferido com atenção  e apreciado sem moderação. Se você for dado a lágrimas, prepare-se. Cerque-se de muitos lenços e evite ser flagrado por algum tempo. Nariz e olhos vermelhos denunciarão que você anda consumindo algo extraordinário. Que seja este romance viciante.



Cotação: *****



sexta-feira, 21 de outubro de 2016

CONTOS APÓCRIFOS - O que a Bíblia não revelou, mas nossa imaginação, sim.


OS LIVROS APÓCRIFOS 
- Antologia de contos inspirados na Bíblia -



A palavra “apócrifo”, do grego apokrypha, significa: “oculto”, “escondido”. Termo empregado para designar livros, documentos não canônicos, textos que foram suprimidos, ao longo dos séculos, tanto no Antigo quanto no Novo Evangelho. 

Idealizada e organizada por Rubem Cabral, a antologia Os Livros Apócrifos (Caligo Editora Ltda, 2016, 186 páginas) reúne contos de nove autores diferentes. A edição, com a capa lindíssima assinada por Pedro Viana, apresenta a qualidade já esperada. O conteúdo não deixa nada a desejar, muito pelo contrário. 

Por ser um conjunto de textos de diferentes autores, a antologia não segue um estilo de escrita definido. Não há homogeneidade de contos, pois cada texto aborda um recorte bíblico, com uma visão particular de fatos não relatados nas escrituras.

A proposta de Os Livros Apócrifos consiste em criar narrativas baseadas nos muitos livros que não foram considerados como parte do cânone bíblico, como, por exemplo, o “Apocalipse de Moisés”, “O Evangelho Armênio da Infância de Jesus”. Para isso, os autores usufruíram de total liberdade ao retratar fatos com visões completamente diferentes dos textos que compõem a Bíblia “oficial”.

As inúmeras possibilidades de criação contribuíram para que os nove autores apresentassem contos surpreendentes. Cada conto apresenta uma versão alternativa, simbolizando um texto apócrifo singular, um pergaminho ainda perdido no tempo e no espaço. 

Relação de contos e autores:

Metamorfoses – Raione LP
O Irmão mais novo – Rubem Cabral
Os três dias – Fabio Baptista
A Torre de Nimrod – Valentina Silva Ferreira
Epístola de Pilatos – José Geraldo Gouvêa
Salomão e a Rainha das Luzes – Claudia Roberta Angst
O Evangelho Sangreal – Bia Machado
A Escada de Jafar – Gustavo Araújo
Vem – Diogo Bernadelli

De Jesus ao Rei Salomão, passando pelos mais variados e marcantes personagens bíblicos como Pilatos, Maria Madalena, Esaú e Jacó, os contos abordam temática inspirada na Bíblia, sendo que cada autor utilizou um tom próprio para criar o seu texto. Alguns escritores revelaram-se mais densos, enquanto outros foram mais irônicos.

Pode-se encontrar nas páginas desta antologia, tanto irreverência e ironia, quanto pinceladas filosóficas, romance e questionamentos. Há, também, relatos inspirados em uma realidade obscura, com a tentativa de humanização dos personagens. 

O leitor não encontrará uma tentativa de superação, nem mesmo comparação, do estilo bíblico. As vertentes de criação foram as mais variadas possíveis: história alternativa, ficção científica, romance, mitologia inventada, etc.

Nove autores e alguns segredos. O leitor é convidado a viajar nas possibilidades do “E se...”, sem se ater a preconceitos de crença, desvendando o mistério de cada personagem segundo sua própria percepção. Lembrando sempre que este é um livro de ficção.

Afinal, o que pode ser considerado real e o que foi inventado? Qual é a sua verdade?  E se...?

Cotação: *****

Livro disponível para venda em: